Contemplativa e comum, “Sol Nascente” entreteve, mas não marcou

Walther Negrão no cenário de "Sol Nascente"; trama seguiu estilo tradicional do autor.
Walther Negrão no cenário de “Sol Nascente”; trama seguiu estilo tradicional do autor

Em se tratando de Walther Negrão não se deve esperar, nunca, nada além do trivial. É esta a principal característica do autor: o lugar comum. É um estilo, como o Leblon de Manoel Carlos, o high society de Gilberto Braga, o suspense de João Emanuel Carneiro e o merchandising social de Gloria Perez. Não é demérito algum, muito pelo contrário.

Não foi diferente com “Sol Nascente”, novela das seis que chegou ao fim nesta terça-feira (21), de acordo com a nova política da Globo de alocar os últimos capítulos de suas tramas num dia aleatório qualquer, movida por uma lógica que o telespectador, comum ou especialista no assunto, desconhece.

O mérito do folhetim foi, sem dúvida, o de lançar dois novos autores, que, a princípio, dividiriam a titularidade com Negrão e, por fim, acabaram assumindo sozinhos a árdua tarefa de entregar à produção seis capítulos por semana. Suzana Pires e Júlio Fischer até ganharam novos colaboradores e supervisores, mas, diante dos problemas que teimavam em aparecer – como a saída temporária da essencial Laura Cardoso –, optaram pela decisão mais coerente: a de manter o estilo Walther Negrão impresso na trama desde o seu primeiro capítulo. Investiu-se mais em cenas de ação e romance, sim. Tudo, porém, com comedimento, como reza a cartilha do veterano autor.

É bem verdade que, a princípio, “Sol Nascente” se dedicou mais à contemplação do que ao enredo. O público se entreteve com as belíssimas paisagens captadas pelas lentes do diretor artístico Leonardo Nogueira, mas não se afeiçoou à trama, que demorou a tomar seu rumo.

A escalação de Giovanna Antonelli e Bruno Gagliasso se revelou um erro: explicações excessivas acerca do passado de Alice (descendente de japoneses sem os “olhinhos puxados”), desajuste de idade, e uma apatia atribuída pelo galã ao mocinho solitário Mário contribuíram para o marasmo inicial. O folhetim ganhou estofo com as investidas vilanescas de César (Rafael Cardoso).

O bom desempenho como malvado-mor da história rendeu a Rafael o posto de protagonista da próxima novela das nove, escrita por Walcyr Carrasco. Merecido! Convém ressaltar também as gratas presenças de Aracy Balabanian (Geppina), Francisco Cuoco (Gaetano), Luís Melo (cuja escalação para o nipônico Tanaka, criticada a princípio, se revelou acertada), Nívea Maria (em participação especial como Mocinha) e, claro, Laura Cardoso, que, na altura de seus 89 anos, não precisava provar mais nada a ninguém. Mas provou! E fez de Sinhá a principal figura da trama. Neste último capítulo, o olhar de Laura, na cena em que Sinhá recebe a notícia da morte do neto, foi o suficiente para conferir um momento de humanidade à vilã.

Entre os mais novos, Maria Joana e a aprendiz de vilã Carol, Giovanna Lancelotti com a sensatez de Milena e Renata Dominguez, voltando à Globo, como a atormentada Sirlene. Por falar em retorno, destaque para a agradável presença de Sylvia Bandeira, Ana Clara, dona do cenário mais charmoso da novela, o da pousada. Letícia Spiller e Claudia Ohana, também eficazes, estiveram à frente da trama paralela mais surpreendente da trama: quando tudo parecia apontar para que Milena (Lancelotti), herdeira de Loreta (Ohana), fosse a filha biológica de Lenita (Spiller), surgiu um novo mistério acerca do antigo ofício de Loreta, enfermeira, e de adoções clandestinas.

No último capítulo, como de praxe, César deixa a prisão e sequestra Alice; perseguição policial em alto-mar e ameaças, César morreu e, amordaçada, a mocinha quase se afoga – surge o herói Mário para resgatá-la do fundo das águas. Virou clichê (vale dizer, aqui, um clichê chato) sequestrar mocinha no final da história; “A Lei do Amor”, que chega ao fim sexta-feira que vem (31), terá situação semelhante. Sinhá se deu bem: fugiu dos Estados Unidos com o afilhado Cristiano (Malvino Salvador). Com tudo já muito bem encaminhado, o restante do episódio se dedicou a contemplar a união das famílias italianas e japonesas, os De Angeli e os Tanaka.

O resultado foi uma novela coerente que chega ao fim cumprindo o que prometeu: entreter sem exaltar. Não representou um estouro na audiência, como a antecessora “Eta Mundo Bom!”, mas cumpriu seu papel nos números (em algumas praças, chegou a ultrapassar “A Lei do Amor”). Contudo, não marcou.

Com destaque na mídia apenas por conta do afastamento do autor e de uma de suas principais estrelas, acabou passando quase que em brancas nuvens. Talvez, vista em reprise daqui uns anos, venha a “acontecer”– caso, por exemplo, da também praiana “Corpo Dourado”, exibida em 1998, às 19h; elevada a outro patamar em 2004. Numa época em que novelas pouco surpreendem, não é de se duvidar que um dia a Globo resgate “Sol Nascente” em “Vale a Pena Ver de Novo”. Fica a questão: para você, leitor, vale?

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Duh SeccoDuh Secco
Duh Secco é  "telemaníaco" desde criancinha. Em 2014, criou o blog Vivo no Viva, repercutindo novelas e demais atrações do Canal Viva. Foi contratado pela Globosat no ano seguinte. Integra o time do RD1 desde 2016, nas funções de repórter e colunista. Também está nas redes sociais e no YouTube (@DuhSecco), sempre reverenciando a história da TV e comentando as produções atuais.