Dez anos depois, a novela A Vida da Gente (2011) está chegando ao fim pela segunda vez na Globo e promete surpreender o público novamente por conta do final da personagem Eva (Ana Beatriz Nogueira).
VEJA ESSA
Escrita por Lícia Manzo, a obra sempre se apresentou como “fora da curva” dos tradicionais clichês que a Globo leva ao ar, focando em situações reais do dia a dia, ao invés de tramas sem fundamento com “mocinhos” e “vilões”.
Composta por personagens que retratam a vida real, a novela mostra o poder da “maldade de ‘gente boa'”, com reflexões que ultrapassam a camada da superficialidade onde as novelas costumam se acomodar.
Assim, a autora partiu da premissa de que ninguém é 100% bom ou 100% mal, que as atitudes de hoje são consequências de situações das quais essas pessoas foram vítimas no passado e as motivaram a agir da forma que agem.
É o caso de Eva, que se doa para Ana (Fernanda Vasconcellos), enquanto trata Manuela (Marjorie Estiano) com indiferença, sendo o foco do grande dilema que paira sobre a novela: a disputa velada na qual as irmãs que se amam enfrentaram.
Por um lado, porém, o folhetim terminou com uma forma de agradar o público da TV aberta, “compensando” as dores de Manuela ao entregar o inexpressivo mocinho Rodrigo (Rafael Cardoso) como prêmio de consolação.
Do outro, a novela encerrará deixando muitas questões em aberto. Questões que, na vida real, não encontram desfecho como em um simples final de novela, mas que só podem ser resolvidas com muitos anos de terapia e autoconhecimento.
É o caso da própria Eva, que termina a novela de forma “branda”, dando uma trégua para Manuela, mas sem deixar a sua essência ácida de lado, ao levar uma comida que ela gosta, mas deixando claro que prefere a outra filha.
Na sequência, a sábia personagem Iná, da saudosa Nicette Bruno, explica o conceito da situação que a autora quis passar para os que estão acostumados com a satisfação rasa de ver os vilões sofrendo com um castigo sólido.
Ana, representando o público movido pela vingança de fazer os “vilões” pagarem pelas suas maldades, lamenta: “É incrível como ela nunca aprende. Ela nunca paga a conta”. Mas a personagem de Nicette discorda, ao filosofar:
“De fato, ela nunca aprende coisa alguma. Agora, quanto a pagar a conta, pode ter certeza que ela faz isso o tempo todo. Imagina ser a Eva 24 horas por dia. Imagina estar na pele dela. Gente como ela é punida diariamente, porque está sempre em guerra, defendendo ou atacando. Nunca tem sossego. Nunca está em paz”.
E a de Fernanda aponta uma solução para lidar com esse tipo de pessoa na vida: “A gente tem que criar uma estratégia de sobrevivência. Lidar com ela como um caso clínico mesmo, com distanciamento”.
Na mesma novela, outros personagens vão sustentar essa mesma ideia de que não existe mudança de uma hora para a outra e que os dilemas não são encerrados com um “final feliz” após o último capítulo das novelas.
Marcos (Ângelo Antônio), que esconde seus defeitos por trás de suas boas intenções excessivas, continuará se “escorando” em uma nova mulher que o conhece e o admira por conta da sua “sensibilidade”.
Cristiane (Regiane Alves) também pagará pelos seus erros de forma leve, voltando à antiga vida que levava como personal trainer, mas já dando em cima dos clientes milionários, podendo dar um novo bote à qualquer momento.
Por fim, a outra antagonista da história, Vitória (Gisele Fróes), terá o mesmo final “feliz” que Eva, satisfeita com as próprias questões internas não resolvidas, encobertas pelo olhar de superioridade que acredita ter sobre os demais.
Redator Publicitário e Gestor de Marcas. Formado em Comunicação Social pela UFRN, escreve desde 2011 sobre o universo televisivo, séries, filmes e novas mídias de forma conectada com as tendências da atualidade.