No ar desde o dia 17 de março, o Combate ao Coronavírus se tornou um dos maiores elos entre o público de casa e a prestação de serviço público. Visto por mais de 24 milhões de brasileiros, o programa se transformou em uma referência ao levar informação de uma maneira leve e ouvir os maiores especialistas do país, na mesma velocidade em que as recomendações de saúde são subestimadas e desrespeitadas por autoridades públicas.
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Um dos sucessos da atração se deve ao prestígio e a credibilidade de Márcio Gomes. Repórter da Globo desde 1995, o jornalista já participou de grandes coberturas jornalísticas, como a ocupação do Complexo do Alemão, em 2010, e a passagem do tufão Haiyan, que atingiu as Filipinas em 2013 e deixou mais de dez mil mortos – neste ano, Márcio já atuava como correspondente da Globo no Japão, onde permaneceu na função até 2018.
O apresentador conversou com o RD1 com exclusividade e falou sobre decisões editoriais do programa, como por exemplo na divulgação de informações oficiais nos momentos em que o ministro Luiz Henrique Mandetta e o presidente Jair Bolsonaro não falavam a mesma língua, e também sobre os ataques que a Globo vem sofrendo por parte do público que apoia o governo.
Confira a entrevista na íntegra:
O trabalho jornalístico de combate ao coronavírus se torna ainda mais desafiador quando é desacreditado pelo próprio presidente da República e por parte de seus apoiadores. Como você avalia esse momento?
Márcio Gomes – Eu e a equipe trabalhamos exatamente da mesma maneira – e não seria diferente. Realizamos a nossa missão do modo correto: ouvindo especialistas, gente que estudou, assistiu como a crise se desenvolveu lá fora e, em cima da experiência científica, diz como estamos e o que devemos fazer para sair dessa terrível situação.
A Globo parecia se comprometer mais com as orientações do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, do que com o presidente Jair Bolsonaro. Como é feita essa decisão, jornalisticamente falando?
Márcio Gomes – Lembrei de uma frase antiga: “se uma pessoa diz que está chovendo e a outra diz que tem sol, o jornalista vai e coloca a mão pra fora”. A Globo tem compromisso com seu público e em buscar sempre a melhor informação. Ouvimos todos os lados. No meio de uma pandemia, o jornalismo ganha uma relevância enorme. Buscamos gente que estudou outras epidemias, se especializou em combater vírus, conhece o nosso país e sua estrutura para explicar o que está acontecendo.
Jornalistas da Globo vêm sofrendo ataques em entradas ao vivo e sendo expostos até mesmo em momentos de lazer. Como lidar com essa violência e com parte do público que desacredita no trabalho da imprensa e no avanço da doença?
Márcio Gomes – Nosso público está dando provas de que confia no nosso trabalho. Nossa audiência está em alta, nosso jornalismo recebe provas de carinho e respeito. As mensagens que eu leio nas redes sociais dão um orgulho danado e sempre divido com a equipe. Só nos deixa chateados não conseguir transmitir a informação correta e bem apurada naquele momento. Mas nada que a gente não consiga entregar depois, pelo respeito que temos com quem nos assiste.
Apesar dos ataques à imprensa, a TV é o meio mais confiável entre os brasileiros para obter informações sobre a pandemia, segundo estudos divulgados pelo Kantar Thermometer. Qual retorno você está tendo do público do Combate ao Coronavírus?
Márcio Gomes – Nosso programa nasceu em esquema de emergência, com equipe de outros programas. As pessoas estão adorando: pelo jeito simples de levar a informação, traduzir os termos técnicos, ensinar o que não se vê em outros programas. Ensinei a fazer uma máscara caseira, testamos o melhor tecido para as máscaras e explicamos o que significa o importante conceito – mas de difícil compreensão, para muita gente – de “achatar a curva”. Ter esse espaço e conseguir fazer tanto, nos orgulha muito.
Quais cuidados vocês vêm tomando diariamente na redação do jornalismo?
Márcio Gomes – Na redação estamos todos usando máscaras, trabalhamos com um espaçamento maior entre os computadores. Todas as mesas têm álcool em gel, álcool líquido, papel.
A subnotificação dos casos, as mudanças nas orientações de prevenção e até as discussões sobre a importância da quarentena são desafios para o jornalismo? Tudo parece mudar do dia pra noite…
Márcio Gomes – Sim, tudo muda muito depressa. É uma missão difícil para os nossos convidados também, e agradeço muito a eles. Afinal, é um vírus novo. Daí a importância de termos boas fontes de informação, pessoas para quem a gente pode ligar – e confiar – para confirmar uma notícia, dar uma luz sobre qual caminho seguir.
A pergunta do Jair de Brasília gerou muita repercussão nas redes sociais. Mas parece que o ilustre espectador do Combate ao Coronavírus não tem seguindo as orientações mais básicas de prevenção. Você acredita que o trabalho jornalístico conseguirá mudar esse comportamento?
Márcio Gomes – Outro dia recebi uma mensagem e até a postei no meu Instagram: um homem dizia que o pai dele só acreditou na gravidade da doença quando viu o nosso Combate. A pergunta do presidente era realmente boa: ele a havia feito na véspera, em um pronunciamento. “Se a doença atinge mais os idosos, por que fechar as escolas?”. Quando ouvi isso, pensei: muita gente ainda deve ter essa dúvida. E como nosso programa quer tirar as dúvidas, tive a ideia de levá-la ao ar, como foi feita. Não estamos aqui para mudar ninguém. Queremos transmitir informação que vai dar segurança para que elas tomem as decisões que consideram corretas. Damos apenas as ferramentas.
Márcio, o seu desempenho na apresentação do Combate ao Coronavírus vem sendo muito elogiado pelo público. Tem gente pedindo por um programa seu nas manhãs da Globo. Você tem acompanhado essa repercussão?
Márcio Gomes – Sim, e acho graça. Deixa este repórter trabalhar…
Daniel Ribeiro cobre televisão desde 2010. No RD1, ao longo de três passagens, já foi repórter e colunista. Especializado em fotografia, retorna ao site para assinar uma coluna que virou referência enquanto esteve à frente, a Curto-Circuito. Pode ser encontrado no Twitter através do @danielmiede ou no [email protected].