Dony De Nuccio pediu demissão da Globo após uma reportagem do site Notícias da TV revelar que ele havia assinado um contrato milionário com a Bradesco Seguros. Na empresa, o jornalista aparecia em vídeos usados para treinar os funcionários.
O anúncio da demissão foi feito via e-mail, na manhã desta quinta-feira (1º), para Ali Kamel, diretor-geral de Jornalismo. Em seu texto, Dony reconheceu o erro ao contrariar a conduta imposta pela emissora e o diretor acatou a decisão “com pesar”.
De Nuccio apresentava o “Jornal Hoje” desde o dia 7 agosto de 2017, há quase dois anos, quando foi trazido da GloboNews para substituir Evaristo Costa. O jornalista demitido ressalta ainda que foi vítima de uma “campanha para me destruir”.
Ele disse que o objetivo dessas campanhas era o de “me sangrar a qualquer custo”, após uma “criminosa invasão de computadores, arquivos e mensagens”. Dony De Nuccio teria embolsado R$ 7.239.692 nos últimos dois anos.
Na empresa, ele produzia “road shows telepresenciais”, vídeos, cartilhas e palestras para o Banco Bradesco. Ele chegou a apresentar vídeos de treinamento para os bancários e atuou como entrevistador dos executivos do Bradesco, sem a emissora saber.
A Globo, por sua vez, exige isenção jornalística em seus Princípios Editoriais. A relação entre Dony e o banco só foi informada à Globo há duas semanas, após uma reportagem do Notícias da TV sobre os vídeos nos quais o jornalista falava sobre o Bradesco Seguros.
Para o canal, não houve má fé por parte do seu contratado e De Nuccio levou apenas um “puxão de orelha” por violar as clausulas. Em resposta, Dony De Nuccio se pronunciou, por meio do departamento de comunicação da Globo.
Na ocasião, ele havia dito “que em meados de julho, retirou-se totalmente da empresa”. Confira os esclarecimentos feitos pelo jornalista e a Globo, antes do pedido de demissão:
“1) Desde meados de julho retirou-se totalmente da empresa citada, não tendo com ela mais nenhuma relação;”
“2) No período em que esteve ligado à empresa, os produtos e serviços foram relativos à produção de vídeos e ao oferecimento de infraestrutura para atividades audiovisuais. A sua imagem como apresentador só foi usada na produção audiovisual de treinamento já objeto de matéria do site (aquela cujo cachê comprometeu-se a doar);”
“3) Em todo o período em que esteve ligado à empresa jamais atuou na captação de clientes e jamais negociou valores ou discutiu pagamentos;”
“4) Os serviços sempre foram prestados mediante notas fiscais e os valores delas não refletem pagamentos feitos a ele, mas os custos totais dos serviços ou da produção. Não confirma nem valores nem serviços relatados pela coluna, e indigna-se com a possível quebra de sigilo fiscal da empresa à qual estava vinculado.”
A Globo, por sua vez, se pronunciou dizendo:
“Esses esclarecimentos já tinham sido feitos à direção de Jornalismo quando parte da produção audiovisual de treinamento foi notícia do site, semanas atrás. Na ocasião, Dony De Nuccio foi advertido de que seu contrato de trabalho proíbe a prestação de serviços a terceiros sem prévia autorização.”
“Feita a advertência, a direção de jornalismo decidiu aceitar os esclarecimentos do jornalista e as providências que ele tomou (assim como o compromisso de não voltar a incorrer no erro). Dony se desculpou e disse ter sido seu entendimento que, ao não se envolver em negociações ou usar sua imagem para publicidade, não infringia normas da profissão ou da empresa.”
“A TV Globo reconhece que não houve má-fé por parte de Dony De Nuccio. Mas afirmou a ele que as regras existem, entre outras razões, para evitar que jornalistas sejam questionados e tenham que dar esclarecimentos tão detalhados à imprensa.”
Dony De Nuccio, novamente, se pronunciou e esclareceu:
“Li com perplexidade a nota sobre minha atuação na empresa PrimeTalk. Gostaria de acrescentar os seguintes comentários:
1) Sou figura pública, mas o faturamento da empresa citada vem de empresas privadas e é absolutamente legal. A quebra do sigilo fiscal é algo que causa indignação. E pode atingir a todos, inclusive o colunista, que vive de publicidade;
2) Apenas apareci como apresentador na produção audiovisual de treinamentos da referida instituição financeira (seja Seguros ou Banco). Na ocasião, mencionei que ‘parte’ da produção tinha vindo a público, o que é fato. E em todos os casos, como também afirmado anteriormente, com veiculação voltada exclusivamente para o público interno e jamais com fins publicitários;
3) Já me desliguei totalmente da empresa citada e não tenho mais nenhuma relação com ela. A formalização do desligamento bem como os trâmites relacionados à Junta Comercial de SP já foram solicitados e estão em andamento desde data anterior à nota de hoje;
4) Está errada a informação de que faturei o valor mencionado na nota. Notas fiscais refletem os custos totais de produção e não a minha remuneração. Os custos envolvem o pagamento de impostos, equipamentos e dezenas de profissionais, como admitido pelo próprio jornalista. Não me pronunciarei mais sobre o assunto, porque tudo o que diz respeito às atividades que mantive na empresa já está esclarecido na nota enviada;
5) Minhas atividades na referida empresa eram fruto do meu entendimento de que ao não me envolver em negociações comerciais nem fazer publicidade usando a minha imagem, não infringia norma. Advertido de que o entendimento estava errado, me desculpei e esclareci os pontos necessários. Agradeço à Globo por ter compreendido que não agi por má-fé.”
Carta de demissão de Dony De Nuccio à direção de jornalismo
“Caro Ali,
Como afirmei anteriormente, não tinha conhecimento de que os tipos de serviços prestados pela empresa à qual estava ligado contrariavam normas da Globo. Reitero que minha função não era negociar valores com clientes, mas sim trabalhar na concepção dos projetos e em seu conteúdo.
Frente à recente onda de ataques que venho sofrendo, e com indícios de criminosa invasão de computadores, arquivos e mensagens, procurei vasculhar o histórico de dois anos de emails enviados por mim enquanto cumpria função na empresa. De fato, na esmagadora maioria das vezes, eu não tratava de valores com contratantes. Mas, em algumas circunstâncias pontuais, e das quais eu sinceramente não me recordava, há sim menção a cifras e projetos. Nos poucos casos em que isso aconteceu, a proposta geralmente não prosperou e a contratação não foi efetivada. De qualquer forma, fui traído pela memória. E me penitencio por isso.
Quero acrescentar também que depois de nossa longa conversa e do relato mais pormenorizado que lhe fiz sobre as atividades já desempenhadas pela PrimeTalk, há um serviço pontual que incluiu o que pode ser interpretado como assessoria de imprensa. Entendo com os olhos de hoje que o escopo dos serviços prestados ultrapassa os limites do que a Globo espera de seus jornalistas. E lamento que, mesmo sem dolo, não tenha percebido isso antes. Não quero mais – por qualquer que seja o artigo ou vazamento na contínua tentativa de destruir minha reputação – constranger você, a Globo ou a minha família.
Desde muito cedo na vida sonhei em trabalhar com televisão, e procurei ao longo de toda minha trajetória me preparar para poder, algum dia, agregar muito valor aos quadros da Globo. Foi pensando nisso que procurei a formação acadêmica mais sólida possível, com jornalismo, economia, extensão internacional e mestrado em economia e finanças.
Em 2011 abri mão de uma promissora carreira no mercado financeiro, para me tornar repórter nos quadros da Globo. Parecia uma decisão difícil, mas não foi: representava o começo de uma nova caminhada, com a qual eu sonhava desde tempos remotos.
Dentro da emissora tive a possibilidade de trabalhar nos mais diversos telejornais e funções, e participar de algumas das coberturas mais marcantes da história do nosso país. Fui repórter do Jornal da Globo, do BDSP, SPTV1 e SPTV2. Fui editor de economia e comentarista do Jornal das 10 e do Hora 1. Ajudei a criar e depois apresentar programas como o Conta Corrente e GloboNews Internacional, além de ancorar o próprio J10, participando de análises políticas e econômicas com algumas das maiores referências do ramo no jornalismo brasileiro. Nos últimos dois anos, tive a imensa alegria e desafio de comandar o Jornal Hoje, dividindo bancada com a talentosa, inspiradora e hoje amiga pessoal, Sandra Annenberg. E ainda pude apresentar o Fantástico e o Jornal Nacional em diversas ocasiões.
Olho no retrovisor com alegria e satisfação por toda essa caminhada, e sou muito grato a você e à Globo pela oportunidade que me deram de bater asas, trabalhar duro e voar alto, ocupando alguns dos mais importantes postos do telejornalismo brasileiro. Fico orgulhoso e feliz com o que pudemos construir e criar juntos.
Mas, assim como é preciso persistência e suor para crescer, é preciso sabedoria para parar.
Nas últimas semanas me vi mergulhado em uma infindável onda de ataques, com a vida dentro e fora da Globo vasculhada e revirada, sigilos fiscais violados, endereços expostos, trabalhos de exclusiva veiculação interna publicados, e até e-mails privados hackeados.
Quanto mais perto estamos do topo da montanha, mais forte é o vento. E é esperado que seja assim. Mas essa contínua campanha para me destruir e sangrar a qualquer custo não pode prosperar. Não faz bem nem a mim, nem à minha família e nem à emissora. Não é justo com nenhum de nós.
Por esse motivo, embora com aperto no coração, solicito meu afastamento do telejornalismo.
E o faço com o espírito leve e a consciência tranquila, porque jamais ajo de má fé. Jamais tive o intuito de burlar regras ou obter benefício que julgasse incompatível com as funções que ocupava na emissora (isso sim, seria incompatível com a minha história pessoal). Trabalhei, duro e dobrado, para complementar a renda, fora do horário da Globo, e dentro dos limites que ao meu ver eram compatíveis e aceitáveis. Se errei, não foi com dolo, e humildemente peço desculpas.
Estou convicto de que em cada um dos dias em que aqui estive tratei com respeito e lealdade a todos com quem interagi, independentemente da função ou hierarquia. E sempre enxerguei a todos não como colegas de trabalho, mas como amigos.
Saio, neste momento, certo também de que em cada um dos dias e anos em que aqui trabalhei, sempre atuei com absoluta paixão e dedicação para levar ao público a notícia da forma mais atraente, correta, completa e interessante possível.
Mais uma vez, muito obrigado pela parceria, pelas oportunidades e pela confiança.
Construímos uma história incrível.
Dony de Nuccio.”
Resposta de Ali Kamel à mensagem de Dony De Nuccio
“Caro Dony,
Agradeço sua carta honesta e transparente. Aceito o seu pedido de demissão com pesar mas, assim como você e pelas razões que você aponta, com a certeza de que é o melhor caminho a seguir. Entendo que é absolutamente sincero quando afirma que não agiu com dolo, e esta carta é uma prova eloquente disto. Nossa longa conversa de hoje cedo permitiu que eu entendesse as suas motivações e você entendesse as razões da Globo. Agradeço os anos em que trabalhou na Globo, que você descreveu tão bem. E o seu empenho e a sua dedicação. Um abraço e sorte na sua nova trajetória,
Ali Kamel.”
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