Sábado de festa para o rei do domingo! Faustão completa 70 anos hoje (2). Nascido no mesmo ano em que a televisão chegou ao Brasil, Fausto Silva é, sem sombra de dúvida, um dos grandes nomes do veículo, dos tempos do Perdidos na Noite (1984) até o Domingão. É gigante “tanto no profissional, quanto no pessoal” – não há um depoimento, de amigos ou colegas de trabalhos, que o desabone. Para reverenciar um de nossos mestres da comunicação, resgatei sete momentos marcantes da carreira de Fausto Silva.
VEJA ESSA
Antes de enveredar pela área em que atua, Faustão pensou em ser padre e advogado. Abandonou o curso de Direito no quarto ano, quando já atuava como locutor das rádios Cultura e Brasil. Na década de 1960, foi repórter esportivo da rádio Excelsior. Nesta mesma estação, já nos anos 1980, apresentou o Balancê; o formato que unia esporte e humor serviu de embrião para o ‘Perdidos’. Fausto acumulou passagens pelas rádios Globo, Jovem Pan e Record, cobrindo, inclusive, duas Copas do Mundo e Libertadores da América.
A primeira experiência na TV se deu como repórter da Record, em 1960, a convite de Blota Jr. Em 1982, estreou na tela da Globo, exercendo a função de comentarista esportivo no Bom Dia São Paulo. O telejornal já possuía o tom informal visto hoje com Glória Vanique e Rodrigo Bocardi. “Foi uma experiência muito boa. Era um jornal de linguagem muito dinâmica, um laboratório para o telejornalismo brasileiro. E, ali, eu consegui impor o meu jeito, o meu estilo, levando o jogador de manhã, gente do esporte, de madrugada, quando ninguém acreditava”, declarou ao Memória Globo.
O Perdidos na Noite foi concebido como quadro do Comando da Madrugada, de Goulart de Andrade – outro “mentor” de Fausto, tal qual Blota Jr, sempre reverenciados por ele. No mesmo 1984, ganhou status de programa solo e migrou da Gazeta para a Record. Dois anos depois, o ‘Perdidos’ seguiu para a Band. O improviso garantia o êxito. “Fausto Silva é aquele gordo esperto que, a partir da absoluta precariedade de meios (incluindo ele próprio), resolveu assumir: pior é melhor”, classificava o Jornal do Brasil (15 de fevereiro de 1987).
O apresentador gracejava dos cenários mal ajambrados e dos playbacks de anônimos e famosos – valorizando o “quem sabe faz ao vivo”. Debochava até mesmo do público, com máximas do tipo “Irritante por irritante fique na Bandeirantes” e “ Quem fica em casa sábado à noite não merece coisa melhor”. Interrupções dos comediantes Tatá e Escova, ora satirizando políticos, ora figuras da concorrência – Sérgio Chapelin, então âncora do Fantástico, virou Sérgio Chapeleta – contribuíam para a “bagunça”.
Citações aos outros canais, aliás, eram recorrentes; Faustão chegava a anunciar os filmes do Supercine (Globo) e da Sala Vip (Manchete), bem como os quadros do Viva a Noite (SBT), de Gugu Liberato. O que poderia soar como estratégia suicida, acabava, na verdade, potencializando a força do Perdidos na Noite. O telespectador não “girava o seletor”, porque aquela opção “capenga” parecia, apenas pelo apreço às estações do lado, mais interessante. E, certamente, mais divertida. Até hoje, Faustão costuma mandar recados e prestigiar a turma off-Globo…
Festejado entre o público jovem, Fausto expandiu seus domínios atendendo os mais novos os mais velhos através de Safenados e Safadinhos, que a Band exibia às 21h20 toda quarta-feira. O objetivo, conforme destacado no Jornal do Brasil (19 de julho de 1987), era “mostrar as potencialidades artísticas e culturais de crianças e idosos; um programa que vai misturar pagodeiros dos 10 aos 60 anos, senhoras num campeonato de crochê, provas de corrida de saco com netinhos e vovôs”.
A concepção foi do próprio Faustão. “Sabe aquele rasgo de inteligência que a gente tem de vez em quando? Isto aconteceu comigo. […] Como falta criatividade nos programas infantis e os velhos mostrados na televisão estão sempre em asilo, doentes ou em baixo astral…”, relatou ele à mesma publicação, classificando o projeto como “infanto-geriátrico”. Baixinhos e grandinhos de idade avançada também tiveram vez no ‘Domingão’, dos convidados do Mano a Mano aos participantes do Se Vira Nos 30.
Fausto Silva foi contratado pela Globo em julho de 1988, cobrindo dois buracos: a emissora buscava um comunicador do naipe de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, falecido no mês anterior; nome pretendido para os domingos em 1987, Gugu optou por rescindir contrato antes de começar a cumpri-lo, voltando para o SBT. A mudanças das noites de sábado na Band para as tardes de domingo na Globo causaram disse-me-disse. No plim-plim, Faustão poderia ser Faustão?
“Vamos tentar fazer uma televisão transparente, uma televisão ao vivo. Não vai ser um programa arrumadinho. O Fausto Silva não vai mudar. O Daniel [Filho] me disse logo na primeira reunião que eles me querem o mesmo Faustão do ‘Perdidos na Noite’, ainda que em outro programa. É só observar a linguagem do ‘TV Pirata’, de ‘Bebê a Bordo’, para ver que a linguagem da TV Globo também é descontraída”, declarou ao O Globo (23 de julho de 1988).
Até mesmo a “boca suja” entrou em pauta. “A época dos palavrões já está passando, inclusive, no ‘Perdidos na Noite’. Foi mais uma maneira de se impor com a Censura e essa fase também acabou”, avisou Fausto na mesma entrevista. Fato é que o ‘Domingão’, embora arrumadinho, preserva o tom do lendário programa que “revelou” Faustão. A grandiosidade da produção impressiona – vide os palcos temáticos do Show dos Famosos. Mas Faustão ainda é Faustão.
A fase mais “contraditória” do Domingão do Faustão foi, sem dúvida, a de intensa disputa por audiência com o Domingo Legal, de Gugu Liberato. Após episódios polêmicos, como do sushi erótico e do Latininho – adolescente de 15 anos que, por conta de uma síndrome rara, media apenas 87cm –, Fausto Silva se restabeleceu, abrindo vantagem no momento em que o concorrente meteu os pés pela mão, exibindo uma entrevista com falsos membros do PCC, facção criminosa que domina os presídios de São Paulo.
Numa entrevista à Veja (21 de maio de 2008), por conta das mil edições do programa, Fausto Silva partiu para mea-culpa: “Não foi nem uma fase, nem um programa inteiro. De 1000 programas, tivemos três momentos trágicos: o sushi erótico, o Latininho e a entrevista com o Belo. O Sushi era um quadro de dois ou três minutos e aí ficaram esticando – eu até falei no ar: ‘eu não estou à vontade’. O problema do Latininho é que ele passou o dia inteiro lá na produção e ninguém notou que havia algo errado. Na hora em que eu o vi no ar é que percebi que o rapaz estava totalmente sem condição”.
“Agora, são problemas internos que só têm essa repercussão porque se trata da Globo. Houve tantos Latininhos em outros programas e ninguém reclamou”, completou. Questionado a respeito de sua culpa em relação aos episódios, Faustão foi categórico: “Em todos. Afinal de contas, minha cara estava lá. Naquela época eu não estava envolvido na produção como hoje. Talvez eu tivesse evitado ou amenizado se fosse assim”. De fato, o ‘Domingão’ não mais voltou a matérias do tipo. Mérito do apresentador e da equipe.
Falar em equipe, é falar do balé que acompanha Faustão desde 1994. “O balé hoje chegou num nível de alto, de respeitabilidade. […] Elas sabem dançar, sabem cantar, dar opinião e fazem as ações de merchandising”, destacou ele em depoimento ao Memória Globo, valorizando a função que, nos primórdios da TV, era mal vista. O apreço pelas colegas de palco rendeu uma saia-justa com a ex-BBB Tatiele, da edição 2014. Quando questionada sobre a vida pós-confinamento, a sister exclamou: “Vou trabalhar bastante. Se nada der certo, viro bailarina!”.
“Para ser bailarina, precisa começar desde cedo. Não é assim, não. As bailarinas têm que estudar bastante, fala aí, Carol Nakamura. Conta pra ela”, rebateu. O atrito repercutiu durante o programa. “Aí a outra vem aqui e fala das bailarinas. Elas dançam 4 horas e ensaiam 5 dias por semana!”, salientou Fausto. O balé do ‘Domingão’, cabe lembrar, hoje atua em um dos quadros de maior destaque da atração, a Dança dos Famosos.
Faustão não é atração só aos domingos. Sua presença nas atrações dos colegas é sempre cercada de expectativa. E de surpresas. Isso é obra tanto da discrição adotada por Fausto nas esferas pessoal e profissional, quanto de sua sinceridade, com um tom de brincadeira. Foi assim antes de chegar à Globo, quando pisou no palco do Show de Calouros (SBT), de Silvio Santos. Questionado sobre o interesse da emissora dos Marinho, Faustão reagiu irônico: “A Globo me quer toda hora, bem longe”.
Em 1991, ele foi ao Xou da Xuxa divulgar o filme Impostor Faustão e o Mallandro. Além de criticar o longa-metragem – produzido pela empresa de Xuxa –, Fausto alfinetou Marlene Mattos, então diretora da Rainha dos Baixinhos. No Altas Horas, em 2018, Fausto Silva impressionou ao revelar sua timidez e reagiu comovido ao ouvir Serginho Groisman se declarar “orgulhoso” e “feliz” por conta da amizade dos dois. Ano passado, tomou café da manhã com Ana Maria Braga, celebrando duas décadas do Mais Você e dominando a web com as brincadeiras dele e da amiga.
Duh Secco é "telemaníaco" desde criancinha. Em 2014, criou o blog Vivo no Viva, repercutindo novelas e demais atrações do Canal Viva. Foi contratado pela Globosat no ano seguinte. Integra o time do RD1 desde 2016, nas funções de repórter e colunista. Também está nas redes sociais e no YouTube (@DuhSecco), sempre reverenciando a história da TV e comentando as produções atuais.