A partir desta segunda-feira (14), Vale a Pena Ver de Novo as emoções de “Cordel Encantado”. A novela de Duca Rachid e Thelma Guedes, exibida às 18h em 2011, retrata a paixão de Açucena (Bianca Bin) – princesa europeia que, num golpe da grande vilã, acaba criada como lavradora no sertão nordestino – e de Jesuíno (Cauã Reymond), caboclo “arretado” que se vê confrontado por sua linhagem, a dos cangaceiros. Sem me alongar no “spoiler”, para quem ainda não viu ou não se recorda, sigo com este texto, voltado para os bastidores deste grande sucesso – para o qual darei uma “segunda chance” agora, já que não simpatizei muito na exibição original.
– Duca Rachid estreou na Globo em 2000, colaborando na exitosa “O Cravo e a Rosa”, de Walcyr Carrasco e Mário Teixeira. Esteve também em “A Padroeira” (2001), voo solo de Carrasco. Em seguida, migrou para o “Sítio do Picapau Amarelo” (2001). Pelo infantil, passou Thelma Guedes, parceira de Walcyr em “Chocolate com Pimenta” (2003) e “Alma Gêmea” (2005). Eis que, em 2006, o autor e a Globo decidiram unir Duca e Thelma, então responsáveis pelo remake de “O Profeta” – obra de Ivani Ribeiro -, supervisionado por ele.
– O êxito desta primeira investida determinou a manutenção da dupla. As autoras então ofereceram três projetos à emissora: “Entregamos um remake, uma novela de época – ‘Cordel Encantado’, que na época chamamos de ‘Pisa na Fulô’ – e uma trama moderna, ‘Cama de Gato’, que a direção escolheu”, contou Duca em entrevista à revista “Meio & Mensagem”, de 28 de novembro de 2011.
– “Cama de Gato” (2009) também saiu de cena em alta. Nova encomenda da Globo às contratadas e, enfim, a possibilidade de produzir “Cordel Encantado”: “Nos pediram para trazer a história para os dias de hoje, mas viram que funcionava melhor ambientada em outra época e os diretores Ricardo Waddington e Amora Mautner compraram a ideia”, revelou Thelma, também à revista “Meio & Mensagem”.
– Amora Mautner respondeu pela direção geral, e Ricardo Waddington pela artística, tanto em “Cama de Gato”, quanto em “Cordel Encantado”. Nesta segunda, uma experimentação: a gravação em 24 quadros – onde a câmera capta 24 imagens por segundo, como no cinema, modificando a “textura” da imagem -; anteriormente, as novelas eram gravadas em 30 quadros.
– O elenco sofreu, logo de início, uma importante baixa: Taís Araújo, convidada para interpretar a cozinheira Maria Cesária, descobriu-se grávida do primeiro filho com Lázaro Ramos, João Vicente; Lucy Ramos a substituiu.
– Heroína de “O Profeta” e vilã de “Cama de Gato”, Paolla Oliveira ensaiou retomar a parceria com Duca Rachid e Thelma Guedes em “Cordel Encantado”. Mas a atriz, cotada para Açucena, acabou recrutada para “Insensato Coração”, às 21h, substituindo Ana Paula Arósio – que abandonou a novela e a televisão.
– Bianca Bin levou a protagonista, após o bom desempenho em “Passione” (2010), como Fátima. Bruno Gagliasso – o vilão Timóteo – e Cauã Reymond – o herói Jesuíno – também foram contemplados com tais postos após viverem Berilo e Danilo na trama de Silvio de Abreu. Entre o término das filmagens de um folhetim e o início das gravações de outro, apenas dias de descanso para Bianca, Bruno e Cauã.
– Ainda, Berta Loran, recrutada pela produção às vésperas das primeiras tomadas, após as recusas de Eva Todor e Glória Menezes, primeiros nomes ventilados para a Rainha-Mãe Efigênia.
– E a volta de Luiz Fernando Guimarães (Nicolau) às novelas, após anos de dedicação a humorísticos. O ator, hoje no ar em “O Tempo Não Para”, estava longe do gênero desde “Uga-Uga” (2000).
– Maurício Destri, então estudante de teatro, foi descoberto por um produtor de elenco da Globo enquanto trabalhava como garçom. Dias após o primeiro contato, Destri fora escalado para viver o príncipe Inácio.
– Primeira novela de Andreia Horta (Bartira) na Globo, após participar de minisséries e séries – além da passagem pela Record. Também o primeiro trabalho, em novelas, de João Miguel (Belarmino), nome forte do cinema, e, assim como Horta, egresso das minisséries e séries globais. Ainda, a estreia de José Celso Martinez Corrêa (Amadeus), figura renomada no teatro, na tela da Globo.
– José Celso, aliás, “causou” na primeira coletiva de imprensa do folhetim. Segundo informações do jornal “O Estado de São Paulo”, de 30 de março de 2011, ele interrompeu o diretor artístico Ricardo Waddington para comentar sua conturbada relação com a Globo; coube a Matheus Nachtergaele (Miguézin) apaziguar os ânimos, ao se levantar para cantar, dispersando a atenção dos presentes.
– Quem também estreou em novelas com “Cordel Encantado” foi Domingos Montagner, que, na pele do cangaceiro Herculano, arrancou suspiros e elogios de todas as plateias. O ator estava no ar com “Divã”, série estrelada por Lília Cabral, quando ‘Cordel’ estreou.
– Uma triste coincidência, aliás, marca o início e o fim da carreira de Montagner. As primeiras cenas de “Cordel Encantado” foram gravadas em Canindé de São Francisco, Sergipe – após buscarem por locações na Chapada Diamantina e Lençóis Maranhenses. Foi num trecho do Rio São Francisco, nesta cidade, que Domingos se afogou, cinco anos depois, durante o intervalo das gravações de “Velho Chico” (2016).
– Assim como Domingos Montagner, no ar em duas produções diferentes, Reginaldo Faria (participação especial nos primeiros capítulos, como Coronel Januário) chegou a ser visto em quatro trabalhos ao mesmo tempo: além da inédita “Cordel Encantado”, as reprises de “O Clone” (2001) em “Vale a Pena Ver de Novo”, “Vale Tudo” (1988) e “Vamp” (1991) – as duas últimas no Canal Viva.
– Novela de época, acreditem, também lança tendência. Esmaltes e cordões utilizados pelas personagens de “Cordel Encantado” eram alvos de telefonemas para a Central de Atendimento ao Telespectador da Globo.
– O figurino, aliás, guarda outras peculiaridades. A capa do Rei Augusto (Carmo Dalla Vecchia) foi desenhada a partir de um rabisco de Mateus, filho de Marie Salles, uma das figurinistas, então com 10 anos. As peças vestidas pelo monarca traziam trançados de metal, feitos por um artesão de brincos. Já as joias de Úrsula (Débora Bloch) foram desenvolvidas por quatro designers contratados especialmente para este trabalho. Havia também uma profissional dedicada somente às coroas – adereços também desejados pelo público. Na França, cenário dos primeiros capítulos, foram adquiridos acessórios suficientes para ocupar 65 malas. Os moradores de Brogodó usavam peças confeccionadas a partir de toalhas de mesa e colchas de filó. Dentre as referências desenhos e filmes antigos, histórias de princesa – claro! -, livros de arte e até a franquia “Guerra nas Estrelas”.
– “Cordel Encantado” chegou ao fim com 25,9 pontos de média-geral. Foi a segunda melhor audiência da faixa nesta década, atrás apenas de “Eta Mundo Bom!” (2016), com 27,1 pontos. E ligeiramente acima da terceira colocada, “Escrito nas Estrelas” (2010), com 25,5 pontos.
– A trama também fez sucesso na internet. Em julho de 2011, o site de “Cordel Encantado” registrou um acréscimo de 31% em suas visitas, no comparativo com o mês anterior. Foram 2.352.000 acessos, recorde para uma novela das 18h até então.
– Dentre os telespectadores ilustres, Ariano Suassuna, que via o folhetim como “uma vitória para todos que sempre defendemos que a cultura de massas se aproximasse da cultura popular brasileira. […] Você veja, colocaram uma gravura animada na vinheta da novela. Uma vinheta claramente inspirada na gravura utilizada no folheto de cordel nordestino. E também tem um personagem que você jura que saiu do meu teatro”, declarou em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, de 29 de abril de 2011.
– Miguézin (Matheus Nachtergaele) é o personagem citado por Suassuna, um dos líderes na preferência do público nos primeiros grupos de discussão, assim como a Rainha-Mãe Efigênia e o polígamo Farid (Mouhamed Harfouch).
– Das 16 músicas da trilha sonora – que também rendeu um CD só com temas instrumentais – apenas 3 não eram de artistas do Nordeste: Filipe Catto, Maria Gadú e Monique Kessous.
– “Cordel Encantado” arrebatou os troféus APCA e Imprensa de “melhor novela de 2011”.
– A novela foi lançada em DVD em 2013. Foi a segunda trama “recente” da Globo a ser contemplada com um box, após a contemporânea “O Astro”; na ocasião, a emissora privilegiava produções antigas como “Irmãos Coragem” (1970), “Selva de Pedra” (1972), “O Bem Amado” (1973), “Escrava Isaura” (1976) e “Roque Santeiro” (1985).
– “Cordel Encantado” é a segunda novela desta década a ganhar reprise em “Vale a Pena Ver de Novo”. A primeira foi “Cheias de Charme” (2012), reapresentada entre 19 de setembro de 2016 e 21 de março de 2017, praticamente na íntegra – 143 na exibição original x 132.
Duh Secco é "telemaníaco" desde criancinha. Em 2014, criou o blog Vivo no Viva, repercutindo novelas e demais atrações do Canal Viva. Foi contratado pela Globosat no ano seguinte. Integra o time do RD1 desde 2016, nas funções de repórter e colunista. Também está nas redes sociais e no YouTube (@DuhSecco), sempre reverenciando a história da TV e comentando as produções atuais.