Regiane Alves, a malvada favorita de Manoel Carlos, relembra papéis, surra e fala da carreira

Regiane Alves

Em entrevista ao RD1, Regiane Alves relembra trabalhos com Manoel Carlos (Imagem: Vinicius Mochizuki)

Bastam algumas interações com Regiane Alves para perceber o quanto ela é gentil e solícita. Mesmo sem querer, a receptividade também é uma prova irrefutável do seu talento.

Se é sempre um prazer conversar com a intérprete, o mesmo não se pode dizer sobre suas personagens. Como parte de um exercício de fugir do óbvio, a atriz sempre se destaca na pele de tipos que amamos odiar.

Enquanto não volta ao ar na próxima Malhação, o público pode matar as saudades de Regiane revendo as suas performances em Laços de Família, na Globo, e Mulheres Apaixonadas, no Viva.

A volta de duas “pestes”

As coincidências que cercam esses dois trabalhos são várias: ambas as novelas foram escritas por Manoel Carlos. Mestre em criar crônicas do cotidiano, o veterano autor a presenteou com duas “pestes”.

Nesta entrevista exclusiva ao RD1 ela relembra Dóris, a menina inconsequente que maltratava os adoráveis avós. Dois momentos servem como um termômetro da avassaladora repercussão deste trabalho: primeiro, quando ela apanhou e recebeu uma lição de moral no elevador.

Depois, quando toda a equipe da novela se reuniu para assistir a cena em que o pai lhe dá um corretivo. Voltando no tempo, ela também revela suas lembranças de Laços de Família, em que foi a pedra no sapato de um dos casais mais queridos.

Engana-se, porém, quem pensa que essa entrevista vai apenas reverenciar o passado televisivo de Regiane Alves. Ao longo da conversa, a atriz também comenta o momento tão peculiar como o que estamos vivendo.

Ela reflete o que aprendeu durante a pandemia e também entrega uma habilidade que talvez a maioria dos fãs desconheça. Com vocês, um bate-papo delicioso com a malvada favorita de Manoel Carlos (e de todos nós também)!

Regiane Alves e o exercício de fugir do óbvio

Regiane Alves gosta de viver personagens diferentes do seu universo (Imagem: Arquivo Pessoal)

RD1 – Laços de Família e Mulheres Apaixonadas, novelas do Manoel Carlos, estão entre seus trabalhos mais marcantes. Que balanço você faz de sua parceria com o autor? Você esteve em mais uma novela dele, não?

Regiane Alves – Maneco me deu personagens muito especiais e marcantes. Foi um autor com quem eu amei muito trabalhar, uma parceria muito gostosa.

Fiz três novelas dele: Laços de Família, Mulheres Apaixonadas e Páginas da Vida. Maneco tem um texto que é sobre pessoas reais, dilemas da vida real.

Acho que é justamente por isso que as pessoas se identificam tanto. E ele me presenteou com papéis importantes para as suas histórias e eu sou grata por essa confiança.

RD1 – Tanto a Clara como a Dóris eram personagens pouco queridas pelo público, mas despertavam reações diferentes. Você concorda? Como avalia a personalidade de cada uma delas? Em nenhum momento você teve medo do estigma de personagens mimadas / arrogantes / antipáticas?

Regiane Alves – Sim, apesar de elas terem um pé na vilania, Clara e Dóris são bem diferentes. E despertavam sim sentimentos diferentes no público.

Clara era uma mulher mimada, que não queria sair perdendo. Agia quase que no desespero porque não queria perder o marido.

Dóris tinha outra pegada. Ela era uma menina inconsequente, imatura, irresponsável. Para ela, o mundo girava em torno dela.

Nunca tive esse medo do estigma, porque esse é o meu trabalho. Eu vivo na TV, no cinema e teatro pessoas diferentes de mim. E eu amo esse exercício de compor e criar personalidades que fujam do óbvio e do meu universo.

Regiane Alves

Em Mulheres Apaixonadas, Dóris maltratava os avós. Na imagem, um flagra com Oswaldo Louzada (Imagem: Divulgação / Globo)

RD1 – A maneira como a Dóris tratava os avós causou repulsa nos telespectadores. Como era, para você, fazer cenas tão pesadas com a Carmem Silva e o Oswaldo Louzada? Conte um pouco dos bastidores

Regiane Alves – Bastidores eram ótimos. Tive a honra de contracenar com esses dois grandes artistas. E como tal, eles sabiam mais do que ninguém que tudo aquilo era parte da cena. E eram parceiros, estavam ali inteiros na troca comigo.

Foi muito bom tê-los comigo, porque a Dóris se tornou um sucesso porque eu tinha os dois juntos trocando de uma forma linda. E o [Marcos] Caruso também.

As cenas nunca eram fáceis, porque estávamos retratando uma realidade que existe. Muitos idosos são maltratados. Tínhamos essa atenção de que estávamos tratando de um tema importante.

A reação inesperada no elevador

RD1 – Por conta do ódio que a personagem despertou, você foi muito abordada nas ruas. Alguma história curiosa que queira relembrar? Dezessete anos depois, como acredita que vai ser a recepção do público?

Regiane Alves – Sim, tive histórias curiosas. Uma vez eu estava no elevador e uma mulher me bateu com o jornal. Eu levei um susto. Não esperava aquilo. Ela disse para eu tratar bem os meus avós (risos).

Fomos gravar uma passeata no Leblon e, enquanto não me tiraram dali, não conseguimos gravar, porque o público queria ver a Dóris. Logo no primeiro dia do Viva, o nome da Dóris foi para os Trending Topics do Twitter.

Apesar do tempo, ela continua trazendo uma reflexão importante sobre a questão dos idosos. E vejo que ainda mexe com a reação do público.

Registro da antológica cena de surra, de Regiane Alves com Marcos Caruso

Registro da antológica cena de surra: Regiane Alves com Marcos Caruso (Imagem: Gianne Carvalho / Globo)

RD1 – Recentemente, o Marcos Caruso brincou que pede desculpas a você até hoje por ter acertado o último golpe na surra de Dóris. Como foi, para você, fazer essa cena? Acredita que a personagem teve o final que merecia?

Regiane Alves – Caruso foi um grande parceiro! Tivemos uma troca sensacional no set. Aquela foi uma gravação muito especial. Quando eu vi, toda a equipe técnica estava no estúdio.

Todo mundo queria ver aquele pai dar um corretivo na filha, que não tinha limites e humilhava constantemente os avós. Ali eu percebi como a personagem estava mexendo com as pessoas.

Entendi a dimensão dela. Eu gosto muito da forma como o Maneco desenvolveu a história. As atitudes foram coerentes com o que ela apresentou ao longo da trama.

RD1 – Os maus-tratos chocaram, mas também ajudaram a sociedade a refletir sobre o tema. Durante a exibição de Mulheres foi aprovado o Estatuto do Idoso. Olhando sob esse prisma, acredita que a novela deve ter uma função social, além de entreter?

Regiane Alves – Fico feliz de saber que um trabalho como que fiz trouxe um legado para a sociedade. O Estatuto do Idoso foi uma grande vitória e muito importante.

Quando podemos divertir e casar o entretenimento com uma função social, temos é o melhor dos mundos. Manoel Carlos faz isso com muita destreza. Ela insere muito bem o merchandising social nas suas histórias.

Na trama, brigas. Nos bastidores, uma amizade

RD1 – Falando agora de Laços de Família, que lembranças guarda deste trabalho? Você era a antagonista da Giovanna Antonelli, na época, uma estrela ainda em ascensão. Como era essa convivência? Quais cenas você destacaria?

Regiane Alves – Foi minha primeira novela na Globo. E foi um trabalho especial. Tinha 21 anos e trabalhando ao lado de grandes feras da TV. Fazendo cenas fortes na frente daquele elenco de grandes atores.

Foi especial. Tenho lembranças ótimas da trama, dos colegas. Eu admiro muito a Giovanna. Ela fez uma carreira linda. E foi muito gostoso reencontrá-la em Cidade Proibida. É uma amizade de muitos anos.

Sobre cenas, impossível não destacar o momento em que a Clara denuncia que a Capitu é garota de programa. Depois da Camila (Carolina Dieckmann) raspando o cabelo, é a cena mais lembrada pelo público.

Vídeo exclusivo de Regiane Alves

A pedido do RD1, Regiane Alves refez o diálogo desta cena. Assista:

RD1 – Quando novelas são reprisadas após muito tempo, o público pode recebê-las de outra maneira, afinal elas são um reflexo do momento em que foram produzidas. Algumas permanecem atuais, enquanto outras revelam algumas abordagens equivocadas. Em quais grupos você colocaria Mulheres e Laços?

Regiane Alves – Para mim, são duas novelas bem atuais. Com temas que ainda precisam ser discutidas. E são tramas que têm as mulheres como protagonistas, falando sobre os seus desejos, sobre ocupar os espaços que lhe são de direito. Isso é tão atual.

Fala de temas como agressão à mulher, violência contra o idoso, doação de medula… E tantos outros assuntos que seguem atuais. Acho as duas muito contemporâneas.

A satisfação com as escolhas

Belinha, de Cabocla, está entre os personagens favoritos de Regiane Alves

Belinha, de Cabocla, está entre os personagens favoritos de Regiane Alves (Imagem: Zé Paulo Cardeal / Globo)

RD1 – Considerando agora a sua carreira como um todo, que outros personagens, além dos já citados, você elegeria como marcantes?

Regiane Alves – Eu sempre acho difícil eleger personagens marcantes (risos). Digo isso porque tive tantas personagens e eu gostei tanto dos trabalhos que fiz. Fico bem feliz com a minha trajetória, com as minhas escolhas.

Fiz vilã, mocinha, personagens dúbias… um pouco de tudo. Dóris é muito marcante. Mas teve a Belinha de Cabocla também. A Marli de Cidade Proibida. Está vendo? São muitas (risos).

RD1 – Já tem algum trabalho em vista na televisão? Se sim, o que pode adiantar sobre a personagem?

Regiane Alves – Sim, já tenho! Estarei na próxima temporada de Malhação. Nós iríamos estrear em 2020, mas, por causa da pandemia, ela foi adiada para 2021.

Regiane Alves: a atriz que empreende

RD1 – Há algum outro projeto pessoal que gostaria de divulgar? A Regiane possui alguma habilidade / vocação / talento desconhecido do grande público?

Regiane Alves – Nem todo mundo sabe, mas eu sou empreendedora. Talvez esse seja um talento desconhecido meu (risos).

Gosto desse universo. Não é nem um pouco fácil empreender no Brasil. E com a pandemia, tivemos muitas perdas e foi preciso se reinventar. Um período difícil.

Tenho a Ella Pizzaria, que, nesse momento, apostamos no Delivery como uma forma de seguir operando.

E estamos agora caminhando de acordo com a abertura do negócio, seguindo todas as recomendações. E possuo também o Massa Trattoria, que está aberto. Os dois são no Rio de Janeiro.

Pandemia é tempo de aprendizado para Regiane Alves (Imagem: Arquivo Pessoal)

RD1 – Falemos agora sobre a pandemia. Com quem você está na quarentena e o que tem feito? Que mensagem gostaria de deixar ao público?

Regiane Alves – Passei esse período com os meus filhos. Na nossa casa. Foi um período diferente para mim e para eles. Nossas rotinas foram transformadas, assim como a de todos nós.

Nesse tempo, eu tenho focado muito no cuidado com eles. É um momento ruim, mas eu tenho fé mesmo de que vamos ultrapassar essa fase.

RD1 – Qual será o impacto desse novo normal, onde o contato físico deve ser evitado, para a classe artística? Autores, atores e diretores terão que se reinventar para entregar sua arte?

Regiane Alves – Já vejo os artistas se reinventando, usando a internet como uma forma de fazer arte. Criando dentro de suas casas. Vamos nos adaptando, mas sem deixar de fazer a nossa arte.

A Globo, por exemplo, se preparou muito para essa retomada das gravações. O processo tem acontecido de forma responsável e gradual.

A interação com os fãs

RD1 – Como e com que finalidade você usa as suas redes sociais? Acredita que elas ajudam a estreitar o contato com os seus fãs?

Regiane Alves – Eu estou ficando mais ativa agora nas redes sociais. E estou gostando muito de ter esse canal com os fãs.

É um espaço em que eu posso falar diretamente com eles. E isso é muito legal. No primeiro dia de Mulheres Apaixonadas no Viva, eu usei o Twitter para ir comentando e foi gostoso ter essa troca com o pessoal.

RD1 – Uma pergunta para a Regiane cidadã: qual a sua concepção sobre o momento em que o Brasil vive hoje? Acredita que um artista pode expressar seu posicionamento político sem comprometer a sua carreira?

Regiane Alves – É um momento delicado que estamos vivendo. Tanto na saúde, como na economia e na nossa cultura. Acredito que cada um tem o direito de se expressar. Desde que seja com respeito, você pode sim falar e dar sua opinião. Isso é a democracia.

Não acho que todo artista tem que falar sobre política. Você tem que falar se você quiser e se sentir bem com isso. Essa imposição, obrigação, ela não é benéfica e nem produtiva.

É legal quando você opina, mas com embasamento, sabendo sobre o que está falando. Não acho legal falar apenas por falar.

RD1 – Sem ser novelas, o que você gosta de assistir na TV?

Regiane Alves – Eu vejo filmes, séries… Documentários. Nesse período de isolamento, eu revi clássicos, descobri novos títulos. Como atriz, gosto de ver atores em cena.

RD1 – Há algo que ainda deseje acrescentar? Deixe uma mensagem aos leitores do RD1.

Regiane Alves – Quero agradecer pelo carinho. E falar para vocês não perderem Laços de Família, na Globo, e Mulheres Apaixonadas, no Viva.

Piero Vergílio
Escrito por

Piero Vergílio

Piero Vergílio é jornalista profissional desde 2006. Já trabalhou em revistas de entretenimento no interior de SP e teve passagens pelo próprio RD1. Em tempos de redes sociais, criou um perfil (@jornalistavetv) para comentar TV pelo Twitter e interagir com outros fãs do veículo. Agora, volta ao RD1 com a missão de publicar novidades sobre a programação sem o limite de 280 caracteres.