O capítulo da última sexta-feira (5) de “A Dona do Pedaço” chegou ao fim com a descoberta de Maria da Paz (Juliana Paes) acerca do filho cadeirante que Régis (Reynaldo Gianecchini) esconde, em mais uma investida de Amadeu (Marcos Palmeira) para impedir o casamento da ex com o bon-vivant. Ganchão? Sim, caso nós não soubéssemos que Maria vai cair em mais uma desculpa esfarrapada de Régis – o casório deve ir ao ar na próxima segunda-feira (8).
Com pouco mais de um mês no ar, “A Dona do Pedaço” já afronta a inteligência e abusa da paciência do telespectador. Para seguir com a sinopse, claramente mal estruturada, Walcyr Carrasco deturpou o perfil da protagonista, justamente o que a novela parecia ter de melhor. A filha de pistoleiros que progrediu vendendo bolos, tornando-se dona de uma rede de confeitarias, agora é uma parva facilmente ludibriada pelo namorado e pela filha Josiane (Agatha Moreira).
Para fazê-la vítima das armações primárias de Jô e Régis, Carrasco tenta forçar o público a acreditar que uma empresária do ramo alimentício não sabe o que é canapé e desconhece os valores comumente cobrados por um buffet. Então a dona dos Bolos da Paz não está habituada a fornecer sobremesas para serviços do tipo? E a confiança no administrador Márcio (Anderson Di Rizzi) é tamanha que Maria não buscou sequer aprender a fazer as mais básicas das contas?
Não é a primeira vez que Walcyr Carrasco submete a coerência de suas novelas à necessidade de preencher capítulos e produzir ganchos capazes de prender o público. O autor é hábil nesta última tarefa – os índices de audiência atestam o êxito de “A Dona do Pedaço”. Mas, o fato de falhar miseravelmente na manutenção do perfil de seus personagens começa a incomodar até o mais fiel dos fãs. A atual novela das 21h não é de todo ruim, mas a condução começa a torná-la “inassistível”.
As primeiras notícias a respeito de “A Dona do Pedaço” indicavam a inspiração de Walcyr Carrasco, na concepção de Maria da Paz, em Raquel de “Vale Tudo” (1988) e Maria do Carmo de “Rainha da Sucata” (1990), ambas defendidas por Regina Duarte. Da primeira, a aversão da filha Maria de Fátima (Gloria Pires) à honestidade da mãe e o crescimento profissional e financeiro através da culinária. Da segunda, a espontaneidade de quem veio de baixo, incomodando seus contatos na alta sociedade.
Em Raquel e Maria do Carmo, no entanto, sobravam a astúcia e a perspicácia que a “prima” Maria da Paz, um dia, demonstrou ter. Raquel e Do Carmo não abriram mão das coisas boas dos “tempos de pobre”, mas buscaram aprender o mínimo necessário para conviver com madames, empresários inescrupulosos e cafajestes. Curioso constatar que, quase trinta anos depois, Da Paz, tipo parecido, se porte de forma tão burra. Sinal dos tempos ou da incapacidade de quem escreve?
Contágio
A burrice, aliás, não é defeito só de Maria da Paz. A atrapalhada Manuzita (Isabelle Drummond) de “Verão 90”, lesa e cega de ciúme – do João (Rafael Vitti) que lhe deu inúmeras provas de amor e fidelidade –, foi incapaz de ouvir o namorado e juntar lé com cré ao flagrá-lo na casa de Moana (Giovana Cordeiro). Artifício das autoras Izabel de Oliveira e Paula Amaral para empurrar a trama das 19h até os últimos dias de julho.
Em “Órfãos da Terra”, o boa praça Jamil (Renato Góes) acredita piamente que Basma / Dalila (Alice Wegmann), figura que ninguém sabe de onde veio e para onde vai, poderá salvá-lo dos problemas financeiros arranjados por Miguel (Paulo Betti). Jamil está deixando se envolver pela criatura, para desespero de Laila (Julia Dalavia), a refugiada que lutou bravamente pela vida e agora age como a mais completa das trouxas.
Como bem destacou Nilson Xavier em seu blog no “Teledramaturgia”: “As três novelas da Globo atualmente no ar usam do subterfúgio mais raso possível para que suas tramas possam seguir adiante: a burrice de seus protagonistas“. Isso, sem falar em coadjuvantes como Chiclete (Sergio Guizé), também de “A Dona do Pedaço”, o matador que desconhece a própria vítima…
A coluna lamenta a saída de Marcílio Moraes na Record. Ou melhor: a coluna lamenta o fato de Marcílio estar fora do ar há tanto tempo – o mesmo para Carlos Lombardi e Lauro César Muniz. O autor deixa a casa onde concebeu obras-primas como “Essas Mulheres” (2005) e “Vidas Opostas” (2006) após cinco anos de geladeira, período em que a Record apostou, quase sempre, em enredos bíblicos. Em tempos de tramas e personagens inverossímeis, saber que Marcílio Moraes está “inutilizado” dá uma tristeza…
Ligo
“Casos de Família”, especialmente episódios como o da última segunda-feira (1º). A discussão de temas como violência doméstica deixa claro que o programa pode ir além do barraco. Não por acaso a edição em questão emplacou a vice-liderança de audiência, prova do interesse do público nas explanações sobre o tema e na prestação de serviço. Destaque para a psicóloga Anahy D’amico, que, com seu comentário final, esclarece os “meandros” do comportamento humano e facilita o entendimento dos debates.
Desligo
“Malhação – Toda Forma de Amar” e o rame-rame de Rita (Alanis Guillen) e Lígia (Paloma Duarte), que disputam a guarda da pequena Nina. Todo dia Rita tenta ver a filha “clandestinamente”; todo dia Lígia flagra e ameaça ir à Justiça. O conflito já esgotou. A entrada da vilã Martinha (Beatriz Damini) no circuito talvez esquente a trama. Ou já é hora de partir em definitivo para o romance de Rita e Filipe (Pedro Novaes), desafiando a família para ficar com a mãe biológica de sua irmã adotiva.
Fecha a conta
O SBT anunciou nesta sexta-feira (5) a estreia do “Topa ou Não Topa” com Patricia Abravanel. O game-show será exibido a partir de 3 de agosto, 15h30, entre o “Programa da Maisa” e o “Programa Raul Gil”. Pode dar muito certo – como os games do “Caldeirão do Huck” – ou pode não dar em nada. Fato é que Patricia se mostrou desenvolta quando cobriu a licença-maternidade de Eliana. Logo, por que não um auditório para a filha número 4 de Silvio Santos? Ou um formato menos frio, como o “Family Feud”?
Duh Secco é "telemaníaco" desde criancinha. Em 2014, criou o blog Vivo no Viva, repercutindo novelas e demais atrações do Canal Viva. Foi contratado pela Globosat no ano seguinte. Integra o time do RD1 desde 2016, nas funções de repórter e colunista. Também está nas redes sociais e no YouTube (@DuhSecco), sempre reverenciando a história da TV e comentando as produções atuais.