A decisão assombrosa de Silvio Santos de trocar o SBT Brasil por uma reprise do famigerado Triturando mostrou-se, ainda na noite deste sábado (23), como algo além da maluquice egocêntrica do dono do SBT.
VEJA ESSA
Silvio simplesmente cedeu aos recados do Palácio do Planalto, contrariado com a edição de sexta-feira (22) do noticiário, que abordou, como todo jornalismo livre e independente, a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, após ordem de liberação do decano do STF Celso de Mello.
Desrespeitosa e acintosa, a decisão abre um grave precedente: até que ponto vai a subserviência de uma emissora, concessão pública, ao Governo Federal? No SBT, registra-se, não há limites.
Do general João Figueiredo, passando pelo verborrágico Fernando Collor, quase-adversário na eleição de 1989, e pelos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, até chegar no “capitão” Jair Bolsonaro, Silvio Santos beijou a mão de todos os presidentes sem corar as bochechas. E o fez no mais claro cinismo praticado por um empresário até hoje.
Não há ideologia que resista ao puxa-saquismo do dono do SBT. Recentemente, em raro momento, soltou uma pequena nota chamando Bolsonaro de “patrão” e afirmando que todo funcionário tem que respeitar as determinações de seu superior, ou então que peça para sair. Silvio bate continência para o dono da cadeira presidencial sem a menor cerimônia. Age como um bajulador.
Ao pisotear seus funcionários, que dirigiram-se de suas casas, em plena pandemia do novo coronavírus, para produzir o SBT Brasil, SS ignora os riscos aos quais os jornalistas foram submetidos, o trabalho de apuração e o esforço para colocar um noticiário que sofre com a falta de investimentos.
Silvio quer mostrar que é o dono do SBT, e manda quem pode. Há, claramente, algum incômodo psicológico aqui. O poder do patrão nunca foi contestado na emissora. Todos sabem de quem é a última palavra lá. No entanto, roga-se pelo bom senso em situações como a atual. Não cabe censura em pleno 2020 – e nunca deveria ter cabido, a bem da verdade. Não há jornalismo sem o contraditório. O resto é panfletagem, algo que satisfaz aos inquilinos do Planalto, governo a governo.
É muito difícil fazer jornalismo no SBT. É tarefa para os fortes. Não há qualquer investimento à altura do que pede o setor. Não há apoio logístico para melhorar o trabalho de todos, muito pelo contrário, há limitações impostas, recados insanos, telefonemas absurdos e a intenção de amordaçar quem simplesmente usa a cabeça para pensar e não bater continência.
O silêncio de executivos, diretores e da família neste episódio soa como algo óbvio: concordância. Não pensem que há qualquer coisa além disso ali. Falta brio para refutar e dar um basta nesse tipo de coisa. Não é possível mudar? Que saiam, que honrem suas biografias. É inconcebível que nomes como Carlos Nascimento, Roberto Cabrini e Rachel Sheherazade sejam associados a isso daí, tá ok? Há vida inteligente e livre além das fronteiras da Anhanguera, muito distante de uma terra dominada por exemplares como Dudu Camargo e Marcão do Povo.
Aos jornalistas do SBT, minha solidariedade.
João Paulo Dell Santo consome TV e a leva a sério desde que se entende por gente. Em 2009 transformou esse prazer em ofício e o exerceu em alguns sites. No RD1, já foi colunista, editor-chefe, diretor de redação e desde 2015 voltou a chefiar a equipe. Pode ser encontrado nas redes sociais através do @jpdellsanto ou pelo email [email protected].